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  • Foto do escritorCamila Polese

Qual vida você quer viver? - A Biblioteca da Meia-Noite e o desafio da escolha profissional

A Biblioteca da Meia-Noite e o desafio da escolha profissional



No início da leitura do livro A Biblioteca da Meia-Noite, me recordei de um antigo texto meu da adolescência, em que expressei a minha angústia diante dos muitos caminhos possíveis da vida. Lembro da analogia que fiz com uma sorveteria, no qual queria ter a chance de experimentar todos os sabores, mas tinha que me contentar com a escolha de apenas um.


A Biblioteca da Meia-Noite tem o mérito de abordar de forma leve e acessível esse grande dilema da vida que me assombrava desde muito nova. O dilema diante das inúmeras vidas possíveis, que geralmente surge com uma pergunta: “Quem eu poderia ter sido?”, pergunta que acompanha inúmeras simulações, das mais sérias às mais banais: O que aconteceria se eu não tivesse ido aquele lugar? Ou aceitado aquele convite? Se eu tivesse entrado na rua à esquerda, e não à direita, quem eu seria? É também esse o drama do antigo filme “Efeito Borboleta”, que marcou a minha geração no início dos anos 2000.


Não por acaso fui transportada para essas lembranças da minha adolescência. É nesse período que é colocado diante de si a missão de uma grande decisão, que parece definir todo o rumo da vida. A pergunta essencial: “O que eu poderia ter sido?” aparece da mesma forma, mas projetada ao futuro: “Quem eu posso ser?”, pergunta que segue acompanhada das inúmeras simulações: Se eu escolher o caminho A e não o B, como vai ser? Vou ser feliz ou vou me arrepender?


Na Orientação Profissional, tal qual Sra. Elm da Biblioteca, oferecemos uma boa dose de diálogos, com reflexões e perguntas. A oportunidade de imaginar como seriam os caminhos, alinhados também à pesquisas profundas, que devem levar a sério o que a realidade apresenta. Com esses diálogos, imaginações e investigações, chegamos juntos a um tipo de escolha.


É uma tarefa multidisciplinar, que envolve aspectos teóricos e técnicos de diversos tipos. Mas me chama atenção o aspecto profundamente filosófico que a tarefa do Orientador implica e que passa muitas vezes despercebido. Nossa tarefa não é apenas identificar habilidades, traçar perfis profissionais, averiguar notas de vestibulares. Nossa tarefa é essencialmente ajudar alguém a escolher um caminho. E escolher um caminho envolve todos os anseios profundos que surgem diante do mistério da vida e da nossa total falta de controle do futuro. É nesse momento que muitos jovens (e adultos) paralisam. Diante de tantas opções, qual é a escolha certa?


Sra. Elm adverte: “Nunca subestime a importância das pequenas coisas”. A tendência é atribuirmos um grande peso a decisão de uma profissão, como se ela determinasse todo o rumo de uma vida. Esquecemos o óbvio: qualquer caminho se faz de muitas escolhas. Não é possível descobrir a priori qual escolha será mais determinante. É um exercício que se faz a posteriori, quando analisamos o rumo que a vida já tomou, e com esforço e sem nenhuma exatidão, criamos uma narrativa tentando identificar quais escolhas determinaram nossa vida. Claro, pode ter sido nossa escolha profissional, como também pode ser algo pequeno que nos escapa, como um não dito, um café ou uma virada de esquina.


Para lidar com esse difícil desafio, talvez o mais importante seja aprender logo no início da jornada, o que o livro claramente entrega: não existe um caminho certo. Na verdade não existe UM, e tampouco o CERTO. É preciso encarar essa realidade universal, de que sempre haverão perdas e ganhos, felicidades e infelicidades, erros e acertos, em qualquer tipo de vida - e em qualquer tipo de profissão. Diante das infinitas possibilidades, é preciso correr o risco de escolher. Esse ato de coragem, requer que a gente se implique com nossa própria existência e se responsabilize em alguma medida, com desejo e intenção. Nos esforçando para ter a vida que queremos, com as condições da vida que temos.


A chave está aí, na mesma missão de Nora Seed: identificar a vida que queremos viver. Quando ela retorna à vida, menciona que o que encontrou na jornada foi esperança e potencial. Nora percebe, ao viver inúmeras vidas, não só tudo o que poderia ter sido, mas que existe em si a potência de ser muitas coisas. O livro termina sem sabermos o futuro de Nora Seed. Assim como na vida - a nossa própria e a das pessoas que acompanhamos em uma Orientação Profissional - não podemos prever o futuro. É um livro em branco a ser escrito. Mas assim como na história de Nora, sabemos a direção que ela deseja seguir, e isso já é muita coisa.


Talvez um bom trabalho de Orientação Profissional - e me permito aqui uma licença poética - seja aquele que ilumina uma direção, amplia as potencialidades e permite a esperança. Direção, porque é preciso ter um norte para caminhar. Potencialidade no sentido de reconhecer que há em si a potência de desenvolver e ser algo. E esperança no sentido literal da palavra: esperar algo, o que inclui fundamentalmente a fantasia e o desejo, elementos fundamentais para um bom trabalho de Orientação Profissional, e por que não dizer, para a vida.






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